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A mostrar mensagens de julho, 2019

Democracia à moda antiga

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Aristóteles, na sua Ética a Nicómaco (livro 8), ao falar da amizade, fala também das formas de governo de das suas degenerações. Que a monarquia degenera em tirania, a aristocracia em oligarquia e a timocracia (governo da maioria) degenera em democracia. E, remata dizendo que a democracia acaba por ser a perversão menos má das formas de governo (Aristóteles vai desenvolver esta ideia na sua Política mas não deixa de surpreender que apareça no livro da amizade). Vários foram repetindo esta ideia, quando diziam que todas as formas de governo são más mas a democracia acaba por ser a menos má. Churchill é um deles é Saramago também o dizia. A Ordem dominicana a que pertenço é, por inspiração, natureza e tradição, verdadeiramente democrática. Diz-se que no século XIII, houve três frades dominicanos que determinaram a sua força e continuidade: São Domingos deu-lhe o carisma, São Tomás deu-lhe a teologia e Humberto de Romans organizou-a. Por um lado está correcto, e já volto a Humberto

Um banho espiritual

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O Secretário deste Capítulo é muito previdente e tenta que aproveitemos ao máximo o Capítulo, com a possibilidade de conhecermos também os arredores de Bien Hoa. Ontem à tarde, convidados pelo bispo desta diocese, fomos celebrar com ele, à Catedral, juntamente com muitos cristãos que habitualmente lá celebram a sua fé. A igreja construída em forma de cruz latina, estava cheia, e, como acontece em quase todas as missas, os dois anexos estavam igualmente cheios. Ao entrar na Catedral fomos recebido com uma banda que tocou o hino do Vaticano! E depois a Missa foi celebrada de uma forma muito bonita, com a força das crianças e adolescentes que se tinham instalado nos braços laterais da igreja. Aprumados, atentos, respondiam e cantavam com uma voz firme e alegre. Um encanto vê-los. Repetidamente se lembra que a história do cristianismo se escreveu com o sangue dos mártires. E é o que vamos sentido quando vemos uma igreja ou um grupo de cristãos de uma fraternidade dominicana. As bases

Bartolomé de las Casas - uma figura inspiradora

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Não há dúvida nenhuma que ao longo de oitocentos anos de vida da Ordem Dominicana muitas luzes brilharam e algumas trevas escureceram a nossa história. Isto acontece desde o particular da nossa vida até à dimensão mais universal que pode ser uma instituição ou até o próprio mundo. Como cidadãos deste mundo podemos gloriar-nos de ter chegado à lua mas também nos entristecemos de termos consentido guerras e situações de injustiça. Neste Capítulo Geral a figura de frei Bartolomé de las Casas aparece como um modelo de pregação para os nossos dias. Um modelo e um desafio. Este dominicano nasceu em Sevilha em 1484. Entrou na Ordem e fez os seus estudos no Convento de San Esteban, em Salamanca, naquela época o maior centro de estudos da Ordem e até para toda a Igreja. Aí conseguiu uma formação sólida nas áreas da filosofia, teologia e direito. Este jovem dominicano, formatado com uma mentalidade de colonizador, é enviado para o Novo Mundo, concretamente para a ilha La Española (actual

Um Mundo, uma Família, uma Missão - 2

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Há mais de oitocentos anos, sensível à fome e à sede que as pessoas tinham pela Palavra de Deus, São Domingos mostrou um desejo espiritual muito forte em estabelecer a Ordem vivendo uma vida de pobreza levando a cabo a missão de pregar e imitar o que exemplos dos discípulos. Ao morrer, São Domingos recomendou aos seus irmãos que não chorassem. Deixaria este mundo para dar mais frutos para os seus irmãos. A sua recomendação é a maravilhosa e a viva esperança que ajuda a fortalecer hoje em dia a existência e o desenvolvimento da nossa Ordem. O grande desejo de São Domingos é inspirar a outros na Igreja ao longo dos séculos. Estes são os que amam e partilham a missão de proclamar a boa nova ao mundo. Viver o carisma da pregação é por em marcha nos caminhos que vão aos lugares onde somos enviados. Os nossos pais na Ordem chegaram às pessoas que não tinham recebido a lua do Evangelho, às fronteiras e regiões de missão, e o Vietnam era um desses lugares. Há trezentos anos os missionári

Um mundo, uma Família, uma Missão - 1

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Foi com este tema que fomos hoje recebidos num convento de irmãs Dominicanas a cerca de 70 quilómetros do sítio onde estamos. O motivo da ida foi o encontro com a Família Dominicana desta região, ou seja, frades, monjas, irmãs de várias Congregações e leigos. Saímos cedo porque pelas 9 horas começaria o encontro com três partes: um espectáculo alusivo ao tema, e Eucaristia com um bispo vietnamita, dominicano, e depois um almoço, preparado pelas várias congregações, com as várias especialidades. Fomos recebidos com tambores, que é uma coisa habitual no Vietname em grandes recepções. Depois encaminharam-nos para o salão, onde assistimos a uma performance absolutamente maravilhosa. Posso dizer que, desde que estou na Ordem, nunca vi um espectáculo desta categoria, com a intervenção de mais de 200 pessoas e foi uma irmã que deu corpo e alma a tudo isto. Som, imagem, representação, música... criativo e emocionante. Depois de mais de uma hora de espectáculo, tempo para nos prepararmos

Uma pausa merecida

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O Capítulo Geral chegou a meio. Em quinze dias conseguimos aperceber-nos do estado da Ordem, quer pelos vários relatórios que nos foram chegando quer também, e sobretudo, pelos relatórios do Mestre da Ordem e do Sindico (ecónomo) da Ordem. Também elegemos o novo Mestre da Ordem, menos pesado que o de há nove anos atrás, quando estive no Capítulo de Roma. Houve, a meu ver, eficácia no método e abertura de intenção. Também começámos os trabalhos de comissões que têm por finalidade dar cumprimento às duas missões dos capitulares: eleger o Mestre da Ordem e definir. Na realidade, ocupámos todo o dia de ontem e a manhã de hoje (sábado) em assembleia plenária para ouvir os trabalhos das várias comissões e podermos manifestar-nos sobre os temas que acharmos convenientes. Não há propriamente discussões, mas sim contribuições e pontos de vista que agora as comissões terão de tratar e integrar para chegarmos à redacção final dos textos que serão aprovados, número por número, por voto electr

Os estudantes II (elogio merecido)

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Todos os dias desperto às cinco da manhã com cerca de 60 estudantes dominicanos do Vietnam a cantar as Laudes e a celebrar a Missa. É assim porque são eles os que garantem o funcionamento do Capítulo. Têm que rezar antes de nós porque enquanto rezamos já estão a fazer funcionar o Capítulo. Vemo-los por todos os lados, com uma jaqueta branca e preta, tipo uniforme, com o escudo do Capítulo. Estão, como digo, em todos os detalhes do Capítulo e garantem tudo o que é preciso, sempre com um sorriso nos lábios, num esforço incansável em responder aos nossos pedidos e em falar nas nossas línguas ou, pelo menos, fazerem-se entender. Estão no acolhimento, a preparar a liturgia, no secretariado, a lavar a nossa roupa!, a preparar refeições... com humildade e, repito, alegria. São homens de serviço alegre e nada tímidos (embora tenhamos de ser nós a começar a conversa). E fazem isto porque o lugar onde estamos, um seminário diocesano, ofereceu o lugar mas sem nada, ou seja, só com o espaço

Em comissões

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Terminada a eleição do Mestre da Ordem, continuam os trabalhos das várias comissões que agora irão reflectir e decidir o futuro da Ordem nos próximos anos. Os capitulares e convidados distribuíram-se de acordo com as suas preferências, tendo e conta também o idioma (inglês, francês e espanhol, que são as línguas oficiais da Ordem). As comissões são 7: Desafios e renovação da vida fraterna, Sinergia entre vida e missão: desafios à pregação, Vocações, irmãos cooperadores e formação, solidariedade e colaboração, Governo e Família Dominicana, Estudos e instituições sob jurisdição do Mestre da Ordem e Constituições. E mim, como creio já ter dito, coube-me (escolhi) a segunda que fala dos desafios entre vida comum e missão. Confesso que aprendo mais que o que digo mas gosto de ouvir os irmãos e os debates. Esta é também a comissão mais desafiante do Capítulo porque se enraíza na questão fundamental que nunca poderá estar fora do nosso alcance: quem somos? A resposta é óbvia: pregadores.

O timoneiro

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Hoje, domingo, foi dia de passeio no Capítulo Geral. Ontem, depois da eleição do Mestre da Ordem tivemos tarde livre (não por esse motivo mas por prudência não fosse não se eleger o Mestre da parte da manhã e termos de continuar pela tarde) onde muitos aproveitaram para sair à rua, apesar dos muitos avisos de cuidado com o trânsito. E é um facto. As motas são aos milhares por todos os sentidos e não param... temos de ser nós a parar senão ouvimos um apito que nos põe no sítio. E aproveitei a companhia de um irmão espanhol para ir ver a catedral e um templo budista. Mas, como digo, hoje foi dia de passeio. Como bons cristãos, não trabalhamos aos domingos. E depois da missa foi-nos oferecido um pequeno almoço reforçado (todos os dias o é) mas com o famoso Pho, que é um caldo com carne, rebentos de soja e outros legumes como coentro ou aipo ou coisa do género. Já tinha perguntado a um dos estudantes quando iríamos provar e hoje, mal cheguei ao refeitório, chamou-me e disse: Father, t

E o Mestre da Ordem é... Fr. Gerard Timoner

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O dia começou à mesma hora mas com sentimentos diferentes. É um dia de responsabilidade. Preparado com a oração hoje é dia de deixar que o Espírito faça o seu caminho ou, se quisermos, deixarmos de lado as nossas preferências pessoais e olhar mais ao bem comum. Por isso, logo de manhã fomos rezar as Laudes, hoje na língua francesa. Depois do pequeno-almoço cada um teve um tempo livre para se preparar para o acto que vai marcar o dia. Antes da Missa, já a subir para a capela, encontrei o Mestre da Ordem cessante, frei Bruno Cadoré, a quem abracei e agradeci tudo o que fez pela Ordem e pelos irmãos. E, então, às 9 horas reunimo-nos na capela para celebrarmos a Missa do Espírito Santo. Esta segunda Missa é mesmo para pedir ao Espírito Santo luz e discernimento para a eleição. Foi presidida pelo antigo mestre da Ordem fr. Timothy Radcliffe, que apesar dos anos continua com a mesma frescura e profundidade. Como dizemos algumas vezes dele: um homem em quem reconhecemos a graça da preg

Tractatus II

Com o entusiasmo da primeira parte esqueci-me de continuar a escrever sobre o tractatus. Ele continua pela tarde, já não no mesmo registo mas numa atitude mais espiritual. Desta vez houve lugar para uma conferência e depois um tempo de adoração com possibilidade de confissões. Este tempo foi especial, não só porque termina um bloco de preparação um tanto humano (perceber quem será o candidato ideal) mas também pela atmosfera espiritual que os nossos irmãos vietnamitas conseguiram transmitir com as suas melodias simples mas muito harmónicas. Já depois do jantar os irmãos têm tempo livre. Uns falam com os outros, outros passeiam e outros vão descansar. Em Portugal ainda é dia mas aqui já é noite. Se Deus quiser, quando Portugal acordar já saberemos quem foi o irmão eleito no Vietnam. Hen Gap Lai !

Tratactus

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Tratactus é uma palavra latina que significa à letra “investigação”. Nós, dominicanos, usamos esta palavra para a conversa que podemos ter antes da eleição de um superior. No caso do Mestre da Ordem é obrigatório e, como já disse, passa por várias fases. Hoje foi a última delas. Depois de termos celebrado a Missa em Vietnamita (uma liturgia de excelência em que os 84 estudantes participaram com as suas músicas e tons tão característicos) e do pequeno almoço, procedemos, então, ao tratactus. Primeiro aviso: não se deve falar de nada do que se passa no tratactus nem com as pessoas que não fazem parte do Capítulo nem através dos meios sociais (explicitaram o Facebook, Twitter, Instagram e por aí fora). Por isso, não poderei falar do que se falou mas posso falar do que se passa, que é simples. Há uma lista final de candidatos e pergunta-se à Assembleia se algum Capitular quer acrescentar algum nome. Essa proposta deve ter o suporte de mais irmãos. Depois escutamos cada um dos que poderã

Comissões e grupos linguísticos

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Hoje tivemos a primeira reunião de comissões. A que me coube foi a de sinergia entre vida e missão: desafios e renovação da pregação. Fui eu que escolhi embora já me tenham dito que deveria estar noutras comissões. Mas foi a que escolhi e foi para mim um desafio entrar em temas não tão trabalhados por mim. Nesta primeira reunião começámos a identificar os temas para incluir nos documentos de trabalho. No fundo trata-se de “partir pedra” e tentar pormo-nos de acordo, o que nem sempre se consegue à primeira. Mas o caminho faz-se caminhando. Além desta comissão houve também já um primeiro encontro de grupos linguísticos para falarmos do perfil e de nomes para possíveis Mestres da Ordem. Este processo repete-se depois num outro grupo, regional, do modo como a Ordem está organizada. O meu grupo linguístico é o espanhol e o regional Europa-Sul, que envolve Portugal, Espanha, Itália e Malta. A dinâmica da escolha do mestre da Ordem deve ser democrática e transparente. Por princípio não

O primeiro dia

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O Capítulo começou oficialmente está manhã, com a Missa do Espírito Santo. Ontem à tarde foi o tempo de integração, com espaço para agradecimentos e primeiras regras de funcionamento. No seu discurso de boas vindas o Prior Provincial do Vietnam, emocionado, lembrava o pedido feito há dois anos ao governo para que este Capítulo fosse possível. E concretizou-se.  Mas, como disse, o Capítulo começou esta manhã, com a Missa do Espírito Santo, presidida pelo Mestre da Ordem. Esta Missa é a primeira em que invocamos o Espírito Santo  de Deus para os trabalhos capitulares. Depois da missa e do pequeno almoç,o foi a vez do Mestre da Ordem cessante apresentar o seu relatório sobre o estado da Ordem. Um documento de 34 páginas e quase duas horas de apresentação. Em termos gerais os números    são sempre uma referência. E os nossos números são os seguintes: 36 províncias, 7 vice-províncias (em crescimento para se tornarem províncias) e 19 vicariatos provinciais (estruturas dependentes de

No mapa tudo é perto

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Foi esta a sensação que deu uma viagem de 16 horas de Lisboa ao Vietnam, com escala no Dubai. Apesar do conforto do avião e das muitas distracções que dispõe, o desconforto de estar sempre sentado, sem grandes espaços para movimentações, fica-se na cadeira grande parte do tempo. Mas, como dizia um dos freis, imagina quem vem de mais longe… Chegámos pelas 20 horas do Vietnam (sempre sete a mais que a de Portugal), e fomos bem recebidos pelos estudantes dominicanos daqui (cerca de 80!). O sorriso e a boa educação que os caracteriza confirma-se nos gestos de acolhimento e atenção para connosco. Uma breve passagem pela Curia provincial onde pudemos comer qualquer coisa antes de prosseguir viagem, agora de minibus, por auto-estrada, cerca de uma hora e meia. E pelas 23.20 chegámos ao tão esperado Seminário de São José, em Bien-Hoa. Com capacidade para 450 pessoas, é ocupado pelos seminaristas desta região (esgotado!) mas como estão de férias podemos nós ocupar este seminário. O amb

Vietnam 2019

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A mala está fechada e falta pouco para mais uma viagem por causa dos Dominicanos: Capítulo Geral electivo, este ano no Vietnam. Ali a Ordem cresce e é um sinal de presença e proximidade com a Ordem que, apesar das dificuldades, continua a ser presença de Jesus e proclamadora da Justiça e da Paz. À semelhança de 2010, em que também fui ao Capítulo Geral de Roma, também ele electivo, vou tentar passar por aqui para escrever as minhas crónicas e impressões do que se vai falando. São experiências únicas, e lembra-me muito os inícios da Ordem em que, todos os anos, os frades se reuniam para decidir o presente e o futuro da Ordem. La vou eu, rumo ao Vietnam, já com saudades do convento, das pessoas e obras que deixo. Até breve.