Na terra dos Filipes

Fui hoje ao Troviscal, freguesia do concelho de Oliveira do Bairro, para uma missa especial: há um mês falecia em Luanda o nosso fr. Gil Manuel da Conceição Filipe, natural desta aldeia onde estive.
O fr. Gil era sobrinho de um outro Gil, dominicano, com o apelido de Alferes. Fundador da "Obra do frei Gil", foi uma referência para o sobrinho de tal modo que, quase sempre aparecia nas suas histórias.
O frei Gil, nascido a 23 de Janeiro de 1936, com apenas dez anos saiu do Troviscal para ir para a Escola Apostólica que os dominicanos tinham em Aldeia Nova. Tomou hábito com 15 anos e professou um ano depois, apenas com 16. Estudou em Escolas filosóficas e teológicas da nossa Ordem. Em 1960, um ano depois de ter sido ordenado padre, torna-se professor de português e francês num colégio dominicano aqui de Lisboa, o Clenardo. Oito anos depois foi enviado para Aldeia Nova, para ser professor e formador e também ajudar nas paróquias vizinhas. Cinco anos depois muda outra vez de rumo, oferecendo-se para capelão militar, primeiro em Lisboa e depois Moçambique, na província de Tete. Poucos meses antes da independência de Moçambique regressou a Portugal e a Aldeia Nova, tendo sido assignado algum tempo depois à comunidade do Porto. Em 1981 é novamente assignado ao Convento de Fátima, ajudando no nosso Secretariado Nacional do Rosário. E esta é a primeira parte da vida do fr. Gil. No ano seguinte, oferece-se para fazer parte dos frades fundadores em Angola. São três os que vão para a Diocese do Sumbe, para a paróquia de Nossa Senhora da Assunção do Waku Kungo, onde foi missionário até ao dia da sua morte.
Embora a segunda parte da sua vida se tenha rematado em três linhas, foi em Angola que o frei Gil se realizou plenamente como frade pregador. Muito humilde e discreto, próximo das pessoas e sensível às suas necessidades, o seu sorriso e os seus gestos de bondade fizeram dele um verdadeiro "patele" (venerável padre).
Por isso não foi de estranhar que o povo do Waku Kungo, em peso, tivesse estado quase uma semana ao pé da igreja, à espera que o corpo do frei Gil, que entretanto tinha falecido em Luanda. E quando se fala de povo em peso, significa muitas centenas de pessoas (como não estive lá não me atrevo a dizer milhares) que o elogiaram e choraram como se tivesse morrido o seu pai.
Um mês depois, fomos ao Troviscal. Ao chegar fui ao cemitério para visitar as sepulturas do frei Gil Alferes, com a impressionante frase lavrada numa placa: "Não matem as vossas crianças, dêem-mas", e a dos seus pais. Ali rezei por eles e por todos os que nos foram próximos e fizeram bem. Não deixei de reparar dos numerosos Filipes, fossem apelidos ou nomes próprios ali sepultados. Disseram-me que ainda hoje o nome está em alta, o que me alegrou. A missa foi celebrada pelo bispo de Aveiro, que quis estar presente, com a comunidade bem presente e, no final, um pequeno encontro dos dominicanos com a família do frei Gil.
Acho que a melhor maneira de lembrar o frei Gil é celebrá-lo. E ter ido ao Troviscal deu para ver como ele era querido pelas pessoas e como a família nos acolheu como se o estivessem a acolher a ele próprio: com alegria, simplicidade e espírito de família.

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