Homilia de São Mateus e sobre o frei Mateus

São Mateus tem para nós, dominicanos, uma singular importância. Talvez porque cada um de nós se revê no relato de chamamento que escutámos no Evangelho. Também um dia Jesus passou pela banca da nossa vida, olhou-nos e chamou-nos e nós, deixando tudo seguimo-lo. Tem também singular importância porque talvez, também nós sentimos o olhar misericordioso de Jesus sobre as nossas vidas. Talvez tenhamos consciência de que o que nos é pedido como cristãos e como religiosos é muito maior do que aquilo que acabamos de cumprir. Tem ainda singular importância porque, de acordo com os biógrafos de São Domingos, trazia sempre consigo o Evangelho de São Mateus e, de tanto o ler e estudar, o sabia quase de cor. São Mateus foi Apóstolo e Evangelista. Judeu, filho de Alfeu, conhecedor da lei judaica, foi chamado por Jesus, seguiu-o, ouviu a sua pregação, viu os seus milagres, reconheceu que ele era o Messias. E depois escreve um evangelho para ajudar os leitores, cristãos que vinham do judaísmo, a consolidar a sua fé em Jesus, a amar a Igreja de Cristo e a serem testemunhas do Reino de Deus onde e como vivessem. Mateus encarna bem o ideal do apóstolo: o que vi, o que ouvi, a minha experiência de Jesus há-de ajudar aqueles que reconhecem Jesus como o Messias. Mas a vida de São Mateus não era fácil. Vivia numa grande cidade comercial, Cafarnaum, tinha um bom emprego e ganharia um bom salário. Mas o bom emprego e o bom salário faziam dele um publicano, um pecador. Por isso, apesar de judeu, ele e os da sua profissão eram tidos como traidores, ladrões, corruptos… Por isso a observação dos fariseus em Jesus se sentar à mesa com gente que, diríamos nós, era imprópria. No Evangelho de Lucas repete-se o mesmo episódio com Zaqueu. Jesus chama este pecador para fazer dele seu discípulo e aceita jantar em sua casa. (Jesus nunca quis fazer uma pastoral do Templo mas sim uma pastoral de rua, de mesa...). E isto é o mais admirável e extraordinário na vida de Jesus: Não importa o passado, importa o futuro. Esta atitude reabilitante de Jesus, com toda a gente, que São Mateus tão bem vai narrando no seu Evangelho, fez com que as pessoas se admirassem com esta novidade de um Deus de recomeços e de um futuro a fazer. E não menos importante é o comentário de Jesus, quando diz que o mais importante é a misericórdia. 
Há 65 anos Jesus passou na vida do Nuno Cardoso Peres. Não sentado no posto da cobrança mas nas cadeiras da faculdade de direito. Também lhe disse “segue-me”, e também ele deixou tudo e seguiu Jesus. A Ordem deu-lhe o nome de Mateus e ele, como São Mateus, foi ao longo da vida testemunha da misericórdia de Deus. Não haverá ninguém que se tenha aproximado do fr. Mateus que não tenha sido escutado, que não tenha sido consolado, que não tenha sentido, através dele a misericórdia de Jesus. Na primeira leitura São Paulo pedia aos Efésios que tivessem humildade, mansidão e paciência. Ao olhar para o fecundíssimo ministério do frei Mateus na Igreja através da Ordem Dominicana que tanto amou e serviu, vemos a sua grande humanidade, um olhar de bondade por toda a criação, e a sua debilidade no que à misericórdia toca. Nestes últimos anos de maior debilidade o frei Mateus desceu os degraus da humildade, ao deixar-se cuidar, aprendeu a mansidão, sendo cada vez mais benévolo e compreensivo e exercitou de grande maneira a paciência, quando, por exemplo, não temos as coisas como queremos, do jeito que queremos e no nosso tempo. Em 2012, nos 50 anos de ordenação de padre do frei Mateus, o poeta Pedro Tamen dedicou-lhe um poema de uma duas linhas, que definem bem a sua passagem entre nós: "Chama tranquila, a que nos chama e nos canta: ardendo andamos". 
Que São Mateus nos eduque sempre e cada vez mais no caminho da misericórdia. E que os santos ao pé da porta, que são para nós testemunhas vivas do Evangelho, que se pratica na vida quotidiano, nos façam arder no amor a Deus e no amor ao próximo.

 

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