Viernes de Dolores
Última sexta-feira da Quaresma. Antigamente chamava-se a este dia sexta-feira da Paixão. Nas igrejas cobriam-se as cruzes e as imagens dos santos com panos roxos. Em Espanha, especialmente em Sevilha, a minha bela cidade, começam hoje as procissões da Semana Santa. As procissões andaluzas são sempre festas, por muito sangrentos que sejam os passos que passam pelas ruas da velha cidade. Além do livro que se edita com a informação dos passos, os dias, as horas e os locais de onde saem, cada dia sabemos quais são as procissões que vão hoje passar pela calle Sierpes, a emblemática rua da baixa de Sevilha, que leva à Catedral. Aliás, Sevilha, nunca perdeu o sentido da devoção. Não serão de muita militância nem de muita pastoral, se calhar vão mais às procissões do que às celebrações, mas fazem sair os santos das igrejas e ajudam nas confrarias às quais pertencem, talvez por tradição. Aliás, a fé (devoção) em Sevilha está mais na rua do que nas igrejas. Porque nas procissões as pessoas são livres de manifestar os afetos. Podem cantar as suas saetas, rezar as suas orações para pedir proteção e saúde para si e para o seus, ouvir as marchas comuns e específicas de cada passo, podem até falar e até beber umas cañas, que fazem sempre um bom acompanhamento.
Questionam os padres e os bispos se não seria de acabar com estas procissões que distraem do essencial. No ano em que vivi em Sevilha, contava-se que o Cardeal queria acabar com as procissões na semana santa, por este mesmo motivo. E lá as confrarias de Sevilha lhe fizeram saber que mais depressa sairia ele de Sevilha do que acabava com as procissões. Ou seja, mais depressa acabam as procissões com ele do que ele com as procissões.
Será sempre uma desgraça quando a Igreja, em vez de pegar nestas manifestações de devoção popular, por muito pagãs que sejam, quiser acabar com elas. Se aprendêssemos com os primeiros cristãos que cristianizaram as festas pagãs de tal maneira que o 25 de Dezembro, outrora festa do deus Sol, se celebra agora como Natal do Senhor...
Quando a religião anda na rua não é mau. Pelo menos porque, já que as pessoas não vão à igreja, vai a igreja à rua, passear os seus santos que, na semana santa, tem um sentido muito próprio. Não são coisas paralelas. São celebrações conjuntas.
Questionam os padres e os bispos se não seria de acabar com estas procissões que distraem do essencial. No ano em que vivi em Sevilha, contava-se que o Cardeal queria acabar com as procissões na semana santa, por este mesmo motivo. E lá as confrarias de Sevilha lhe fizeram saber que mais depressa sairia ele de Sevilha do que acabava com as procissões. Ou seja, mais depressa acabam as procissões com ele do que ele com as procissões.
Será sempre uma desgraça quando a Igreja, em vez de pegar nestas manifestações de devoção popular, por muito pagãs que sejam, quiser acabar com elas. Se aprendêssemos com os primeiros cristãos que cristianizaram as festas pagãs de tal maneira que o 25 de Dezembro, outrora festa do deus Sol, se celebra agora como Natal do Senhor...
Quando a religião anda na rua não é mau. Pelo menos porque, já que as pessoas não vão à igreja, vai a igreja à rua, passear os seus santos que, na semana santa, tem um sentido muito próprio. Não são coisas paralelas. São celebrações conjuntas.
Este dia para mim lembra-me sempre Sevilha. O ir ao final da tarde à igreja de Omnium Santorum, ver sair a procissão de Nossa Senhora das Dores e o Cristo da boa Morte, ouvir a música trágica dos tambores e dos metais, sentir o cheiro do nardo e do incenso, ouvir uma saeta, ver o desfile dos nazarenos com as suas velas nas mãos, e voltar para casa, pedindo a Deus que a morte de Cristo me continue a comover e me converta.