Entre o palco e o altar... e fora dele

Ah, e o que é que o frei acha da história do palco do Papa? Uma pouca vergonha. De uma ponta a outra.
O palco acaba por ser só um pequeno pormenor do plano de alguns deslumbrados, que não sabendo quem são, nem dando a cara (e não há muito por onde fugir), vão sacudindo a água do seu capote. Agora que a casa caiu já ninguém acha piada a nada e até se diz que as jornadas deviam ser fora de Lisboa. Ainda assim é de louvar o Carlos Moedas pelo seu estoicismo: abandonado por todos (e de certeza que todos lhe foram dando palmadinhas nas costas) dá o corpo às balas, custe o que isso custar quer a ele quer aos munícipes. E, obviamente, não pode dizer tudo o que se passou, pelos compromissos… para que outros não fiquem mal, fica ele mal, mas não é normal terem até invocado exigências do Vaticano e o Vaticano vir demarcar-se de toda esta confusão. Neste despilfarro (palavra espanhola que em português poderia significar desperdício), como noutros que a nossa história recente pode comprovar, há sempre muita euforia em aceitar os desafios, mas depois todos se esquecem da responsabilidade que se tem de assumir. É óbvio que quando a Diocese de Lisboa avançou com a candidatura foi com a garantia de que o Estado e o Município se iriam comprometer a apoiar o evento. Se o Estado não apoiasse financeiramente as JMJ, é óbvio que não havia candidatura. Tanto é assim que até uma comitiva do Estado foi ao Panamá festejar e tirar selfies. Por isso, por aqui, a Igreja não peca e se há pedras a atirar não é por este motivo.
O que é que tudo isto nos tem mostrado? Que há muitas equipas, que até há um arquitecto nomeado pelo Governo para coordenar tudo mas que, afinal, nada funciona em equipa. É surpreendente ver o coordenador de um projecto surpreendido com o valor de uma parcela do palco… até parece que soube pelas notícias. Em eventos desta envergadura, é próprio das equipas trabalharem em conjunto para que tudo corra bem, não esquecendo que o dinheiro vem dos contribuintes, e que deve ser respeitado sempre, e ainda mais em momentos difíceis como os que estamos a viver. Vemos também agora que falhou tudo no que diz respeito a prazos e concursos e passa tudo a ajustes directos… falhou tudo na informação dada ao país… falhou tudo no esclarecimento de que a zona escolhida não é por causa do Papa nem foi exigência da Igreja mas, aproveitando a vinda do Papa, se pode melhorar aquela zona… falhou tudo quando se diz que no futuro o palco pode ser reaproveitado mas não de diz em concreto em quê… mandam-se umas ideias para o ar, só para acalmar as hostes, mas ninguém a acreditar no que está a dizer (veja-se o caso dos estádios abandonados depois do Euro 2016).
No entanto, o palco-altar foi só o princípio de uma grande descoberta: afinal, comparado com a despesa geral das Jornadas (também ela exorbitante), o altar nem é caro. O que piora tudo. E agora vai ser pior a emenda que o soneto: manter tudo como está nos preços apresentados, com muita possibilidade de subirem pela pressa que há em ter tudo pronto é um escândalo; conseguir baixar os preços é dar razão a quem andou a dizer que afinal se pode fazer a coisa por menos é que o deslumbramento é que era muito. Entre estas duas hipóteses, venha o diabo e escolha… se ele for bonzinho, ainda assim, escolhe a segunda hipótese.
Uma última nota sobre o palco-altar. Não sei se algum deslumbramento não estará na própria Igreja portuguesa. Admito que o Vaticano faça algumas exigências em relação ao altar e às coisas necessárias às celebrações, mas nunca o Vaticano se iria pronunciar sobre a estrutura do palco, como veio dizer. Mais que os valores escandalosos deste evento eu, por natureza, deveria ser digno mas sóbrio e não faraónico como temos vindo a descobrir, o que me magoa é que a Igreja não tenha sido a primeira a travar a megalomania, que não tenha sido clara na pergunta que todos fazem: com quanto é que a Igreja portuguesa vai contribuir para as Jornadas (não basta dizer que as contas são auditadas), que tenham sido outros, fora da Igreja Católica, a dizer que o que se está a fazer não é e todo o estilo do Papa Francisco. Que de facto não é.

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