O terço da Renascença

 

Este meu escrito mais que um protesto é um lamento. Ao fim de 55 anos a Emissora Católica Portuguesa, a Rádio Renascença, decidiu mudar a hora da transmissão do terço. O terço transmitido começou em 1953 e desde 1968, do directo às 18.30h passou agora para o diferido às 20.30h. As explicações explicam pouco, e pessoalmente não me convencem. Mas ilustro o meu lamento. Nasci em 1975, cresci e fui criado pela minha avó. Não havia um dia nem excepção -  a menos que a excepção viesse da própria rádio - em que na cozinha, enquanto ela preparava o jantar, religiosamente às 18.30h, a rádio não estivesse com som alto a transmitir o terço. Ao entrar no pátio já se ouvia o terço e não se falava; quanto muito “boa tarde”. Não havia perguntas nem respostas, conversas importantes ou o que fosse: estava-se a rezar o terço. E às vezes mandava-se calar. Ora, isto marca. Não só a minha avó mas tantas outras pessoas… mercearias, táxis, casas, aldeias, até igrejas. Quantas pessoas não sendo católicas respeitaram, ouviram uma Ave Maria ou um Pai-nosso, e isso marcou. Os motivos invocados são tão banais que não convencem. Não consigo imaginar como é que um director de programação de uma rádio católica não faz a pergunta: onde é que eu estou às 20.30h para poder rezar o terço? Quem está a jantar vai passar a jantar com o terço ligado? Pôr em concorrência a rádio com a televisão? O terço da rádio com o noticiário da televisão? É certo que as rádios acompanham as vidas das pessoas mas há programas que estão de tal modo institucionalizados que mexer neles é dar cabo do resto. E para mim hoje foi um retrocesso na vida da Renascença.

Não vou rebater os motivos, por detrás dos expostos há outros mais aliciantes, mas não posso deixar esquecer que há uns anos atrás a Renascença também transmitia uma Missa às 19h de domingo. Do sempre passou para trocar de vez em quando, por um relato de futebol até que, domingo à tarde é demasiado apetecível para manter uma Missa que pouca gente poderia ouvir, em troca de um relato. Seria impensável passar um relato em diferido mas suprimir a Missa já era mais normal para uma emissora católica. É certo que a Renascença tem de dar lucro e tem de chamar audiências. Mas o vale tudo não é critério. A Renascença irá lucrar mais com publicidade às 18.30h do que com os poucos milhares de pessoas - e maioria idosas - que ouviam o terço. Mas quando uma rádio católica trata assim os seus programas católicos... que esperar do resto? Que os programas religiosos passem na televisão às 15.45h e na rádio às 6.45h... encolhemos os ombros mas cedemos... uma rádio católica que despacha assim uma transmissão tão querida e estimada por tanta gente... A minha mãe, que também era uma das que ouvia a transmissão do terço, às vezes enquanto preparava o jantar, hoje disse-me: "Às oito e meia vou deixar de estar à mesa para pôr o terço? Esta gente não regula". A Renascença não tem pena, é só menos uma a ouvir o terço.
 
Termino invocando a sabedoria da minha avó que, diante destas coisas que lhe causavam tristeza e lamentos, dizia: os padres começaram com a religião e hão-de dar cabo dela. A Renascença está a ir pelo mesmo caminho. Não nos admiremos que daqui a uns anos o terço das 20.30h, além de diferido, passe paulatinamente para a madrugada por motivos de programação.

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