Em cima desse penedo

Há 32 dois anos que não vinha a Feirão aos Santos. O meu avô morreu em 1980 e a minha avó vinha todos os anos, religiosamente, limpar e compor a campa do meu avô. Até que, num ano, vim com ela. As memórias são algumas: frio e chuva, uma casa inóspita (ainda em construção e sem aquecimento), o cemitério cheio de flores e, à noite, com velas, tal como o acabo de ver.
Teria eu dez anos e terá sido, muito provavelmente em 1985.
Tantos anos depois, o ritual repete-se nesta tarde: as pessoas vão ao cemitério compor as campas e acender as velas. Amanhã, a Missa dos Santos e a ida ao cemitério e, na sexta, para quem pode, a Missa dos Defuntos.
Aqui a ideia da morte está muito presente. Não se pode dizer que há um culto dos mortos mas é, sobretudo memória e gratidão dos que nos precederam na vida e na fé. Também eu, hoje, fui aos dois cemitérios acender as minhas velas. Pelos meus avós. E rezar por todos.
Lembrei-me durante o dia de hoje de uma cantiga que a minha mãe nos cantava em dias tristes como estes. A história é triste e a música não ajuda. Quando a minha mãe a cantava, nós chorávamos mas, ao mesmo tempo, nós pedíamos para ela a cantar. Não consegui que as minhas capuchinhas a cantassem e, por isso, ficam só as quadras:

O que fazes tu, criança,
Em cima desse penedo?
Eu quero ir ao cemitério
Mas sozinha tenho medo.

O que tu vais lá fazer
Se não mora lá ninguém?
Mora sim, senhor coveiro
O meu pai e minha mãe.

O meu pai foi para a França
Houve lá uma grande guerra.
Minha mãe com pouca sorte
Foi para debaixo da terra.

Eu também tinha um irmão
Que me servia de pai.
Até esse, senhor coveiro,
Até esse já lá vai.

Cinco horas a bater
O coveiro fecha a porta.
Olha para trás e vê
A menina estava morta.

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