Os fumos sagrados


No domingo passado, perguntaram-me no fim da Missa, o porquê do incenso e porque é que a umas coisas se incensam de uma maneira e a outras de outra. Prometi escrever sobre o assunto e cá vai.
É uma ideia errada a de que os turíbulos (defumadores de metal presos a três correntes onde se queimam grãos de incenso) começaram por se usar nas igrejas para eliminar maus odores. Esta ideia, muito ligada ao Botafumeiro da Catedral de Santiago de Compostela - aí sim poderia estar incluído esse objectivo - é muito circunstâncial. A principal razão, anterior ao cristianismo e até ao judaísmo, é a de adoração às divindades. Há registos das religiões orientais em que se fala de queimar resinas e outras plantas aromáticas em louvor das divindades.
Mas podemos atribuir, na Igreja Católica, a origem do uso do incenso ao povo judeu. Na Bíblia temos algumas narrações deste ritual de queimar incenso em honra do Senhor. Baste-nos como exemplo o que se narra no Livro do Êxodo sobre a construção do Templo em que se prevê o altar dos perfumes - o lugar onde se queimava o incesno aromático.
No cristianismo, é pelo século IV que aparecem os primeiros rituais de queimar o incenso nas Eucaristias. A razão é obvia: com a liberdade de culto e o fim da perseguição dos cristãos e com a construção livre das igrejas, torna-se mais fácil enriquecer as cerimónias litúrgicas.
O uso do turíbulo, que ao longo dos séculos conheceu várias formas, não é só um objecto onde se queimam os grãos de incenso. O ritual tem a sua dignidade: não é balançado nem arremessado; é apresentado, elevado e conduzido em direcção da pessoa ou udo objecto que se quer incensar.
O sentido espiritual do incenso é duplo: por um lado é um ritual de adoração às coisas sagradas e por outro o fumo do incenso é comparado às nossas orações que sobem até Deus. É assim que se reza no salmo 140: "Suba até vós a minha oração como incenso / elevem-se munhas mãos como oblação da tarde".
São várias as celebrações onde se pode usar o incenso. Normalmente usamo-lo em celebrações de grande solenidade.
Quem e o que é que se incensa? Antes de mais a Deus. A Ele se eleva o fumo do incenso. Por isso, tomando por exemplo a celebração da Missa, se incensa logo no início o altar, a cruz, e a imagem de algum santo, se for caso disso. Na Páscoa, por exemplo, pode-se incensar o Cirio Pascal, sinal da presença de Jesus Ressuscitado na sua Igreja. Depois o livro dos Evangelhos. É a Palavra de Deus que merece a nossa veneração. Finalmente incensa-se o pão e o vinho, matéria do sacramento da Eucaristia que se vai tornar o Corpo e Sangue do Senhor.
Um outro grupo de incensações é o das pessoas. Também nós somos incensados porque fazemos parte do povo sacerdotal. O primeiro a ser incensado é o que preside à assembleia; depois os sacerdotes que com ele concelebrem e finalmente o povo.
Pode fazer-se a pergunta: mas então não é só a Deus que se incensa? Porque é que se incensam as pessoas? Respondo com outra pergunta: E nós não somos templos onde Deus habita?
Antes do Concílio Vaticano II havia regras muito precisas sobre o modo de incesar. Caíram em desuso a partir do Concílio. Agora não uma regra definida, embora os usos e costumes tentem manter-se fiéis ao que se fazia antes.
Normalmente com o túribulo aparece uma caixa de seu nome naveta (porque se parece com uma nave) onde se guardam os grãos de incenso. A fotografia ilustra um pouco os dois objectos.
Pessoalmente gosto de usar o incenso. Além de enriquecer a celebração, sinto que toda a assembleia que está ali comigo fica envolvida naquela nuvem perfumada que sobe para Deus. Pena que algumas pessoas vejam no incenso uma tentativa do "regresso ao antigamente".

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