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A mostrar mensagens de outubro, 2010

Cinco anos

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Hoje a igreja do Convento onde vivo celebra o quinto aniversário. Os que assiduamente cá vêm dizem: Já cinco anos? Sim, já cinco anos. E eu também os celebro. Há cinco anos que me entregaram a pastoral da igreja do Convento. Muita gente diz que é uma referência não só para a diocese de Lisboa como para todo o país. Digo-o em relação à arquitectura, obviamente. Antes de mais pela singularidade de ser uma igreja conventual, o que distingue e identifica. E a grande diferença entre uma igreja paroquial e a conventual está no objectivo: uma igreja paroquial deve adptar-se à realidade do território da paróquia enquanto que, na igreja conventual, o que acontece é a identificação das pessoas com a realidade conventual. A própria arquitectura na concepção da igreja do convento vai mais num estilo comunitário do que individual. Alguns pormenores: não tem uma pia baptismal. Porquê? Porque não é uma igreja paroquial. Não tem um lugar específico para confissões: em qualquer lado da igreja, num simp

Os embates da vida

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Entender a vida como uma planície, verde, cheia de beleza, sem mais nada, é uma ilusão. Uma paisagem bonita é aquela em que a combinação de volumes, cores e odores é quase perfeita. E assim é a nossa vida. Talvez no meio da montanha não tenha tanta piada como vê-la ao longe ou do seu cume o horizonte dos nosso olhar. Sendo a nossa vida uma paisagem, que será a planície ou a montanha? Cicatrizes dos embates da vida. Ontem, duas conversas amargas. Duas grandes montanhas (por vezes esquecemo-nos que a beleza de uma montanha foi o resultado de um violento embate da terra) numa paisagem tão plana e tão calma. Uma mãe, num estúpido acidente - daquelas situações em que se diz à hora errada no sítio errado - perde um dos filhos. No hospital, entre lágrimas, vai desfiando as suas dores e angústias, como quem vai passando as contas de um rosário. Diz-me que teve a honra de o ver nascer e de o ver morrer. Diz que lhe custa não ter o filho, não o ver. Diz que ainda não descobriu o outro modo de pr

Homilia do XXX Domingo do Tempo Comum (24 de Outubro)

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A parábola contada hoje no Evangelho que, acabámos de escutar, pode ser entendida como uma provocação. Provocação para os ouvintes de Jesus, provocação para as primeiras comunidades cristãs e hoje provocação a cada um de nós. E é uma grande provocação que se pode desfragmentar em várias provocações. A primeira provocação é a dos actores da parábola. Um fariseu e um publicano. Um fariseu que fazia da aparência a sua vida, que tinha que ser reconhecido pela comunidade porque era exemplar e um publicano que era excluído pela comunidade pelo seu trabalho: era tido como um ladrão, como um explorador, dava-se com os inimigos do povo. Outra provocação é a do tipo de oração que estes dois homens fazem: ambas sinceras. O fariseu assume uma atitude normal do seu modo de rezar: está de pé. A sua oração é sem hipocrisia: é um homem recto, observa a lei – ainda que só na sua exterioridade –, evita os pecados, não rouba nem é injusto como o publicano que estava também a rezar. Ele até faz mais que o

Os Valinhos

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Acabou hoje o retiro. Consegui ter uma tarde livre em Fátima. Tem sido raro, nos últimos dias, ir a Fátima e ter tempo livre, só para mim. Como o retiro acabou depois do almoço e só vinha para Lisboa depois do jantar aproveitei para caminhar. Três horas. Para fazer um recorrido nos arredores do Santuário: Via-Sacra dos Valinhos, Calvário Húngaro, Loca do Cabeço, Aljustrel, Fátima (igreja paroquial e cemitério) e regresso a casa pela "Estrada principal de Fátima". Para mim a Via-Sacra dos Valinhos continua a ser o melhor de Fátima. Lembro-me que, quando era pequeno, era devoção obrigatória da peregrinação da paróquia de Marvila. Muitos autocarros, megafone... uma solenidade; o prior presidia, os leitores liam, os cantores cantavam os cânticos antigos que agora já se não usam, as pessoas muito piedosas e nós, os mais pequenos, sempre uma estação à frente, olhávamos para o quadro e deixávamos no altarzinho de cada estação umas florinhas apanhadas à beira do caminho. Hoje, adulto

Este meu dia

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Estou em Fátima. Cheguei ao fim da tarde para vir pregar um retiro. O tema será a oração. Da oração de Jesus à nossa oração. Mas o dia de hoje foi muito engraçado. A manhã foi, logicamente, a preparar as últimas coisas: impressão do texto, mala, livros, etc. etc. Mas a hora do almoço foi no Externato de São José, no Restelo. Este ano que retomo o acompanhamento deste Colégio, pediram-me que fosse uma vez por mês, à hora do almoço, sem motivo. Dir-se-ia, "pastoral da presença". Cheguei ao meio-dia, fui para o refeitório, onde estavam os do 1º e 2º ano a almoçar. Novidade no refeitório, olá eu sou o Gonçalo, e tu quem és? Eu sou o Filipe, e ficaram as apresentações feitas. Lá os animei a comer rápido, com a promessa que, depois do almoço ia brincar com eles ao toca-e-foge. Numa outra mesa estavam quatro de castigo, vá-se lá saber o porquê - nem eles sabiam bem - aliviar um bocado o drama, houve um que até chorou e diz-lhe um colega: chorar não te tira do castigo, mas é sinal de

Os nossos "Natanaeis"

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Faz daqui a poucos dias quatro anos que fui a Bruxelas ao ICNE (Congresso Internacional da Nova Evangelização). Fui a convite do Prior do Convento que queria presença "jovem" para a animação desse Congresso. O mais interessante eram as conferências que, cada manhã, aconteciam na grande basílica do Sacré-Coeur. Houve uma do nosso dominicano Timothy Radcliffe. A conferência era sobre o anunciar a Boa Nova aos habitantes das grandes cidades da Europa. Na altura não nos tínhamos de preocupar com tirar notas porque, no último dia, era-nos dado um livro com todas as conferências. Trouxe o livro, emprestei-o e o que é certo é que me desapareceu. No sábado passado, estando no Campo Grande à espera da hora de um casamento, enquanto 'espreitava' a biblioteca do P. João Resina (diz-me o que lês e dir-te-ei quem és), encontrei o livro! Não era o meu, claro está, mas era o mesmo livro. Tirei fotocópias da tal conferência que ontem acabei de ler. E mais uma vez se conclui que Timot

A toque de sinos

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Nada mais bonito que ouvir sinos tocar. Já foi o tempo em que marcavam a vida da cidade ou da aldeia. Desde o toque para a escola até ao toque para a missa ou a rebate para fogo, o sino tem cadências diferentes, formas de se exprimir e de nos dizer o que quer ou que se passa. Tenho na minha memória alguns sons de sinos. Como esquecer os sinos em Feirão que, no domingo, nos anunciam com festa a Missa? Ainda hoje me arrepiam. Ou os de Taizé, com um timbre tão próprio... O sinos têm e transmitem sentimentos. O sino canta quando alguém é baptizado ou casa. Chama quando é para ir à Igreja à Missa ou ao terço. Chora quando morre alguém. E, se é homem, chora de uma maneira; se é mulher, chora de outra. E vamos sabendo o que se passa pela maneira como tange. Hoje fui ao Paço do Lumiar fazer o baptizado do Gonçalo. Uma igreja antiga, lindíssima, do século XVII (1603), com um belo adro. Entregue aos jesuítas desde há quatro anos, o padre Alberto, homem simpático e acolhedor, pôs os sinos a tocar

Os mineiros do Chile

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Afinal tudo foi mais rápido que o previsto e tudo correu bem. Os trinta e três homens, prisioneiros no ventre da terra durante sessenta e nove dias, voltam à normalidade possível das suas vidas. E o mundo foi parando, com emoção, para ver a saída de cada um. Emoção primeira para os mineiros, depois para os familiares, chilenos e para todo o mundo. Uma tragédia com excelente sucesso. Muitos deles, à saída, tiveram atitudes religiosas: uns ajoelharam, outros rezaram, outros ainda traziam roupa com frases religiosas "Gracias, Señor!". Deus não esteve ausente; Deus tem um nome: Esperança!

Bíblia, Oração e Consumismo

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Este título poderia ser o de um retiro. Mas, de facto são de três intervenções que terei de fazer a curto prazo: um curso de iniciação a São Mateus, um retiro sobre oração , que acontecerão nas próximas semanas, e um encontro sobre cultura e pregação, com data marcada mas que só se realizará em 2011. Tenho estado a trabalhar em São Mateus e na Oração a todo o vapor. Tinha levado material para o Capítulo Geral, para ir lendo e arrumando ideias; agora é o tempo de esquematizar e dar conteúdo. No entanto, ontem comprei um livro sobre a sociedade contemporânea. É mais um ensaio filosófico, de um filósofo marcante, Gilles Lipovetsky, sobre a sociedade do hiperconsumo. O livro tem o título " A felicidade paradoxal ". E, de facto é o que se vai vendo. A procura da felicidade, a felicidade que quase é uma religião, e que, ao mesmo tempo não trazem a verdadeira felicidade. Os humanos contemporâneos somos chamados por este autor como homo consumericus, consumista. Como é óbvio ainda n

Um poema sobre o terço

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Nesta noite de Domingo, depois das Missas e dos encontros, agora que tudo está mais calmo, que se ouve a chuva cair e passo os olhos sobre um livro de orações, deixo aqui uma, atribuída a Charles Péguy (1873-1914), sobre o terço (estamos no mês do Rosário): Reza o terço, diz Deus, E não te preocupes com o que o tresloucado afirma: que é uma devoção antiquada, que vai ser abandonada. Essa oração, digo-te eu, é um raio do Evangelho: ninguém ma mudará. Eu gosto do terço, diz Deus, porque é simples e humilde. Como foi o meu Filho. Como foi a minha Mãe. Reza o teu terço e encontrarás ao teu lado toda a companhia reunida no Evangelho: a pobre viúva que não estudou e o publicano arrependido que já se esqueceu do catecismo, a pecadora cheia de medo que gostariam de esmagar, e todos os coxos cuja fé salvou, e os bons antigos pastores, como os de Belém, que descobrem o meu Filho e sua Mãe... Reza o teu terço, diz Deus, é preciso que a vossa oração, rode, rode e volte a rodar, como fazem entre os

Uma revista nunca lida

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Ela chega ao convento cada seis meses. Uma das revistas "chatas". Importante para a história, é certo, mas sem grande interesse actual, uma vez que vem sempre desactualizada. Trata-se da revista oficial da Ordem dos Dominicanos, a " Analecta Ordinis Praedicatorum " (Colecção de escritos da Ordem dos Pregadores). É uma revista que recolhe os actos oficiais da Ordem. O último número que chegou foi o referente a Julho-Dezembro de 2009. E hoje deu-me a curiosidade de a folhear. E gostei. Além das coisas muito oficiais, como homilias do Papa em celebrações com dominicanos ou das cartas das Congregações Romanas à Ordem, aparecem também as cartas do Mestre da Ordem a Províncias ou a frades, e também da vida das Províncias. E aparecem coisas da província de Portugal!: as nomeações do nosso Capítulo Provincial, os delegados aos Capítulos Gerais (acho que foi a primeira vez que o meu nome apareceu!), e as notícias necronológicas (os irmãos que faleceram ao longo de 2009). Alg

Solidão habitada

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Acabo de enviar um mail aos Cartuxos de Évora. Hoje celebram o seu fundador; é dia de São Bruno. Os cartuxos são conhecidos pela sua austeridade de vida, pelo silêncio e pela solidão. Tudo contrário aos desejos do mundo: temos mais do que o necessitamos, não suportamos o silêncio (dois exemplos: a malta nova com os phones nos ouvidos e a televisão que preenche o silêncio) e vemos a solidão como uma coisa horrível, quase uma doença. Mas com os cartuxos não é assim. Eles optaram pela austeridade, optaram por uma vida de silêncio e pela solidão. Como se vivessem no deserto. Têm como ícone São João Baptista. Acham que Deus fala no deserto, que só com o silêncio se pode ouvir Deus e só com a solidão poderão desfrutar da sua presença. São pouco conhecidos. Não fazem grandes propagandas nem vocacionais nem existenciais. Mas eles lá estão, rezando pelo mundo e suas necessidades, com os que rezam e pelos que não rezam, com os que têm fé e pelos que a não têm ou a perderam. Um apostolado invisív

São Francisco de Assis

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Hoje é dia de São Francisco. São Francisco e São Domingos foram contemporâneos. Coincidiram no tempo e na opção de vida. Mas a popularidade de São Francisco é muito maior que a de São Domingos. São Francisco continua a ser um grande exemplo para o mundo de hoje, e tem a capacidade de juntar várias sensibilidades das nossas sociedades como a paz, o diálogo inter-religioso, a ecologia… é capaz até de ser admirado por algumas pessoas mais afastadas da religião. Miguel Torga, por exemplo, Tinha uma grande admiração por São Francisco. Uma vez escreve assim: “ S. Francisco de Assis, o meu santo. E louvei-o mais uma vez como pude. Chamei-lhe o Cristo da bem-aventurança terrena. Um Cristo poeta, sem o dramatismo árido do deserto e da expiação, a pregar transparências num cenário de branduras idílicas. Um Cristo que integrou o próprio demónio na fraternidade cósmica. Um Cristo humilde, sem a vocação do mando, alérgico à propriedade privada, fundador do sufrágio universal por voto secreto, anarq

Uma prenda de Deus

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Celebra-se, hoje, a festa dos Santos Anjos da guarda. Anjos sem nome, uma prenda de Deus. É uma ideia errada a que se propaga nas revistas de esoterismo e de pseudo-angeologia de que podemos saber quem é o nosso Anjo da guarda. É uma prenda. Uma prenda que Deus nos dá, segundo a Tradição cristã, no dia do nosso nascimento. Também, para muitos, a primeira oração aprendida foi dirigida ao Anjo da guarda: Anjo da guarda / minha companhia / guardai a minha alma / de noite e de dia . Alguns que, como eu, apanharam ainda as catequistas antigas, que ensinavam a doutrina e as orações, lembram-se de uma outra oração mais completa: Santo Anjo do Senhor / meu zeloso guardador / pois a ti me confiou / a piedade divina / hoje e sempre me governa / rege, guarda e ilumina . Ponto aparte, infelizmente tem entrado na moda uma canção dos Xutos que, em alguns colégios e aulas de catequese, anda a substituir a cândida oração por esta canção, em que se pede ao Anjo da guarda para sonhar, ser astronauta e v