Filho és, pai serás

Não há nada pior do que depender dos outros. É um ponto de vista. Uma criança dirá exactamente o contrário porque sabe que depender é bom. A partir de uma certa idade, em que se nota que começamos a ficar limitados, de que precisamos de outras pessoas que nos ajudem a vestir, a comer, a ir connosco a algum sítio, dar banho, essa dependência pode levar a depressões, teimosias mais agudas o que não ajuda nada na nossa qualidade de vida. Como me questionava um doente, no hospital, num destes dias, apontando para o seu corpo: é isto imagem e semelhança de Deus?
Acredito que quem esteja a passar por situações destas, e ainda esteja lúcido, se pergunte o porquê de envelhecer... e a resposta não será a mesma de Cícero, que escreveu, lá no longínquo século I antes de Cristo, uma obra a que deu o título "A arte de envelhecer". Ele tinha uma visão bem mais optimista, certamente partilhada por muitos homens e mulheres que vivem em pleno esta fase de ouro da vida. Chegou a comparar a senectude ao bom vinho que nunca azeda...
Mas para quem perdeu a lucidez das coisas? Quem já não sabe o dia em que está, nem conhece amigos... às vezes até os próprios filhos, quem não valoriza sequer quem cuida dele? É um mistério. Para quem cuida deles tem de ter muita paciência e respeito, o que nem sempre vamos vendo por aí nos lares e até nalguns ambientes familiares.
Vem este post aqui a lume não porque me esteja a sentir velho e dependente ou que me atormente o espírito a possibilidade de uma demência tal que venha a esquecer o meu nome. Já estou por tudo. Vou percebendo que nem sempre o que quero é o que Deus quer e não adianta andar a dizer as minhas preferências. Que Deus me dê coragem para viver o que vier. Também não é porque esteja a ler algum livro sobre esta temática - aconselho vivamente o "Elogio da velhice" de Hermann Hesse; é o medo da falta de paciência para lidar com algumas destas situações.
Vem a propósito desta falta de paciência o vídeo que vos deixo. Quando o vi pela primeira vez fiquei perturbado. Ainda agora me deixa a pensar que, às vezes, queremos que os outros tenham muita paciência para connosco mas nós impacientamo-nos por tão pouco. Mas, antes do vídeo, quer como introdução ao vídeo ou uma conclusão ao que escrevi, aqui ficam uns versículos da Bíblia (Ben Sirá 3, 12-15) sobre este mesmo assunto que nos podem ajudar no trato com quem depende mais directamente de nós:
"Filho, ampara o teu pai na velhice, não o desgostes durante a sua vida; mesmo se ele vier a perder a razão, sê indulgente, não o desprezes, tu que estás na plenitude das tuas forças. A caridade que exerceres com o teu pai não será esquecida, e ser-te-á considerada, em reparação dos teus pecados. No dia da aflição o Senhor há-de lembrar-se de ti, os teus pecados hão-de dissolver-se como o gelo em pleno sol".


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